Estante

Estou com sono. Não posso dormir, e estou com sono. Tal pensamento me tortura enquanto levo à boca a xícara que por mim morre de amores.  Provo o doce do líquido enquanto vislumbro a minha estante. É curioso como, no início, o chá é doce quando entra na boca, e logo depois se torna amargo. Exatamente como as pessoas são. É realmente muito curioso.

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Beijo

A dúvida é a maior doença do homem. A incerteza é seu maior sintoma. Tanto é plausível a esperança quanto se aflige do desespero.

Quando o sol nasceu, era nisso que eu pensava. E quando o sol se pôs, ainda pensava nisso. Foi uma aurora preguiçosa e um crepúsculo sangrento. O processo, porém, é o que me faz hoje refletir. Continuar lendo

Mentes

Durante toda a vida, usamos os sentidos para perceber o mundo a nossa volta.  Do momento em que nascemos até o último suspiro, os sentidos guiam e ditam as direções da vida em questão. Dor, física e emocional, prazer, identificação e até mesmo novas relações são iniciadas a partir deles. São o irreal que é real. Os  sentidos são o véu fino que separa a realidade  de um mente de outra. Continuar lendo

Pesadelo

Quando segurei pela primeira vez a caneta cuja tinta preencheria estas páginas, sabia no que resultaria. Tinha consciência de que muito raramente estaria feliz em escrever sobre o que sinto. Sabia que seria uma válvula de escape, um alívio. Havia a certeza de encontrar nas palavras o colo que mulher nenhuma teria. Um seio que me acalentaria quando nenhum outro poderia fazê-lo. Trocaria o choro do meu coração pelo choro das páginas. Continuar lendo

Embriaguez

Os ébrios cantam num bar. Esta é uma noite fria num lugar quente. Hoje regresso à realidade, voltando de um mundo de fantasias mil.

Retorno para os sete pecados capitais. Observo aqueles rostos embriagados cantando sobre amores – como se a paixão fosse o eixo primordial da civilização. Caminho por ali imaginando que será de mim em hora tão negra. O brilho cálido da lua toca nossos rostos rosados.

Sou como eles. Continuar lendo

Tempestade

Minha caderneta, minha querida caderneta. Suas páginas agora são pontos amarelados da minha história. Já faz bastante tempo, querida, tanto tempo. Vão-se madrugadas solitárias e manhãs felizes. Assomam-se dias ainda mais tempestuosos, ou mais felizes, não sei. Hoje minha caligrafia se verifica especialmente trêmula.
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Calor

“Você precisa de uma bela jovem para aquecer seu coração”, foi a afirmação enviada a mim. Ri. Ri da situação e do pensamento – é isso que meu coração é? Frio?

“Precisa de foco”. Era o bastante. Me levantei e disse, por cima dos ombros: “Eu, foco? Desde quando?”. É o oposto. Sou desfocado. Continuar lendo

A Flor

Ao leitor assíduo destas páginas, outra narrativa. Uma narrativa deveras metafórica e – devo dizer – cíclica. Se deu no passado, acontece agora, e irá se repetir sem cessar enquanto eu respirar.

Entenda, há uma flor. Uma flor maior que eu, enorme. Ela cobre minha cabeça. Na verdade, seria correto dizer que eu estou enfiado debaixo da flor. Sinto o perfume, a conheço, mas não a alcanço. Meus braços não são suficientemente longos. Continuar lendo